O ser humano é “lixado”!
Inúmeras vezes enaltecemos a nossa postura de amizade e entreajuda quando nos cruzamos com outros motociclistas, por esse mundo fora. E sabe tão bem! Parece que, estejamos onde estivermos, nunca estamos sozinhos… E é verdade, em caso de percalço, aparece sempre alguém para ajudar.
Mas se essa é a nossa forma de estar, quando vamos em cima da mota, porque diabo não a temos igualmente fora dela, nomeadamente quando vamos a pé?
Se paramos na berma de estrada ao nos depararmos com outro motociclista parado e perguntamos se está tudo bem ou precisa de ajuda, porque não fazemos o mesmo quando nos deparamos com alguém em dificuldades na rua?
Um dia, ia eu a atravessar a ponte 25 de abril, em Lisboa, na minha Pan European, quando passa por mim uma Yamaha YZF 600. Só que, como o trânsito estava caótico, o escape dele riscou do início ao fim, um pobre FIAT PUNTO comercial que seguia na minha frente. Ele viu, mas continuou e, dentro do carro, as duas pessoas gesticulavam freneticamente.
Eu fiquei “passado” com aquele cenário, e decidi tentar apanhá-lo, já que era difícil passar e ele não podia ir muito depressa. Correu bem e, a seguir ao tabuleiro, na avenida da ponte, consegui fazê-lo parar.
Parei na frente e, depois de tirar o capacete e ambos desmontarmos, perguntei se ele não tinha visto o que tinha feito. Nunca me respondeu.
Entretanto pára o carro e saem lá de dentro duas pessoas, mãe e filha, esta última a conduzir, sem experiência e “branca como cal”. A mãe vem direito a nós e a primeira coisa que diz é:
– Estes gajos das motas são indecentes, uma vergonha!
Eu interrompi-a e disse:
– Bem, eu estou de mota, fi-lo parar e estou disposto a ajudá-la a resolver esta questão, mas se continua a insultar-me, vou embora!
A senhora então apercebeu-se do que tinha dito e pediu desculpa, mas estava muito nervosa e disse o que não devia.
Claro, era natural. No meio disto tudo, eu achei estranho o jovem condutor da Yamaha nunca tirar o capacete. Como tinha pressa para chegar ao meu destino, deixei os meus dados à Sra., caso necessitasse, e fui embora.
Cerca de duas semanas mais tarde a Sra. telefonou-me e agradecer a minha disponibilidade, pois o rapaz da outra mota não tinha seguro, mas a mãe trabalhava numa seguradora e queriam os meus dados, mas ela não deu, “pois eu era sua testemunha e não deles”. Finalmente conseguiu a reparação do carro e estava tudo resolvido.
Ao despedir-se, disse-me então que a sua imagem dos motociclistas tinha mudado completamente desde aquele episódio e nunca mais ia esquecer.
Aquelas palavras encheram-me a alma, pois não só tinha feito o que considero ser o meu dever enquanto cidadão, mas também contribui para que alguém que não tem qualquer ligação ao mundo motociclístico, passasse a ter uma imagem positiva a nosso respeito.
Quantas vezes se cruzaram com aqueles automobilistas que têm um crucifixo pendurado no espelho retrovisor, supostamente sinónimo da sua conduta de acordo com os valores que a sua fé professa, mas depois insultam toda a gente, buzinam loucamente e se for preciso, ainda saem do carro para agredir?
Sabem, não é só parecer. Há que sê-lo também!
Boas curvas